domingo, agosto 01, 2004

Madrugada 4/3

Quando acordo ela está pendurada pelo pescoço numa das traves do tecto do meu quarto, e a sua língua azul está descaída, morta, e há leves rastos de sangue seco a partir dos seus olhos vazios. Eu sento-me na cama e vejo a sua camisa de dormir rasgada, o peito e o pescoço furiosamente arranhados numa tentativa de apressar a morte.
Uma cadeira está caída ao lado de uma mancha escura no chão, o sítio onde o sangue dos seus pulsos abertos coagula, congela, e eu estou a pensar que não é possível ela ter-se enforcado com os pulsos naquele estado – cortados de uma forma tão profunda, tão metódica, tão bárbara.
Terei sido eu? A noite passada é apenas uma mancha na minha memória. Levanto-me e reparo que os pés dela estão a escassos centímetros do chão. Os dedos azulados apontam para baixo, como se estivessem a tentar apoiar-se em algum lado. Talvez ela não quisesse morrer.
Quando lhe toco, um enorme vibrador sai com um som obsceno de entre as suas pernas e cai no chão, rolando até tocar nos meus pés.
Precipito-me para a janela e abro as cortinas e a luz inunda o quarto, e quando me volto para trás, com uma ligeira esperança, ela ainda lá está.


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